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segunda-feira, 18 de agosto de 2008

"UMA LIÇÃO DE VIDA" - Carlos Rímolo.

Conta-nos um velho conhecido que, lá pelos idos dos anos 60, numa cidadezinha interiorana do agreste cearense, vivia um homem, matuto de origem que, nascera com um pequeno defeito físico: não possuía parte do seu pé esquerdo e, se usufruía disso.
-Por favor, uma esmolinha para um aleijado! Ajude-me! Pelo meu “padinho” padi Cícero, uma esmolinha! Implorava ele a todas as pessoas que encontrava.
-“Vá trabalhar, cabra da peste! Vá fazer alguma coisa”! Respondeu um senhor bem idoso, puxando um jegue que, se curvava ao peso de dois grandes balaios cheios de forragens.
E assim esse homem de nome Severino ia tocando a sua vidinha ociosa. Levantava-se ainda no escuro, comia um pão dormido mergulhado num café requentado e, saía cedo para a mendigagem. Trabalhar para quê? Pensava ele, já que as parcas moedas que lhes chegavam às mãos, eram suficientes para alimentá-lo por mais um dia, pelo menos enganar seu estômago e, lhe dar uma vida boa e descompromissada.
Ele fazia ponto na pracinha central do lugarejo, pouco cuidada e arborizada. Às vezes, passava horas nos degraus do pequeno coreto cochilando e, dando um “tapa” na preguiça.
Com pena do homem, muitos lhe ofereciam empregos que, eram sempre rechaçados por ele sob a alegação de que era um deficiente físico e não podia trabalhar.
Encontrava-se nesta vida desde criança, quando fora abandonado pelos pais que, eram muito pobres e, não queriam suportar esse fardo que era ele. Como alimentá-lo e vesti-lo se nada tinham. E assim resolveram abandoná-lo, deixando-o nas mãos do destino. A sua casa a partir dali passou a ser a rua e sua cama um banco de jardim.
-Um esmolinha, por favor! Uma esmolinha! Insistia ele a todo instante.
E exaustivamente durante todo dia, Severino implorava e recebia mais não do que sim, mas mesmo dessa forma, não desistia e, ia empurrando a sua vidinha ociosa com a barriga.
Um belo dia ensolarado, peregrinando pelas ruas com as suas muletas, ele viu algo que o impressionou e que, mexeu com as suas estruturas, fazendo-o balançar e repensar a sua vida.
Há uns dez metros dali, vira um senhor bem idoso, de barbas brancas e compridas, face bem enrugada, bem frágil, mas de feições bondosas, sem as duas pernas, e se equilibrando sobre uma velha cadeira. Ele vendia peças de artesanatos com um sorriso largo no rosto, tratando todos de igual para igual, disputando seu espaço junto a outros negociantes do ramo no local.
Aquilo lhe chamou a atenção e, o fez se aproximar do homem, mesmo um pouco desconfiado. Ainda hesitante, chegou bem perto do velho sertanejo para conferir o motivo daquela sua alegria, já que o problema dele era bem maior e ele se encontrava feliz.
Já frente a frente com o ancião, Severino com uma voz trêmula e insegura o interpela:
-Meu velho, o que o faz sorridente e lhe dá forças, se és um aleijado desgraçado como eu? Um pobre coitado relegado pelo mundo? Esquecido até por Deus?
O outro ergue a cabeça e o fita demoradamente como se procurasse alguma coisa e, minutos após, lhe dá a resposta contando o segredo de sua força e alegria de viver:
-“Meu filho, o homem muitas das vezes tem a cura de sua doença na luta, através da fé, do amor, do trabalho e, acima de tudo, da perseverança. Temos algo muito precioso que está acima de nossos defeitos, que é a vida. Temos de saber vivê-la com inteligência e amor, pois é única. Trilhar nossos caminhos felizes, para que possamos seguir o rumo dos homens de bem e de Deus! Nosso corpo está mutilado, mas o nosso espírito é são”!
Encerrando a sua curta história, o nosso narrador nos disse que ele, ao ouvir a simples, mas bela lição de vida daquele ancião, aos prantos e envergonhado, afastou-se dali apressadamente e nunca mais foi visto na cidade ou arredores.

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